sexta-feira, 10 de agosto de 2018

Sabores do Cáucaso

Aqui estamos nós sentados, os representantes dos três mais importantes povos do Cáucaso: uma geórgica, um muçulmano e um arménio. Nascidos sob o mesmo céu, sustentamos pela mesma terra, diferentes e, no entanto, idênticos...como as três identidades de Deus. Ao mesmo tempo europeus e asiáticos, recebendo e transmitindo tudo o que vem do Ocidente e do Oriente”.


Quem faz esta reflexão é o personagem arménio, de seu nome Nachararjan, no livro nacional do Azerbaijão, “Ali e Nino”, de Kurban Said.
Foi isso que sentimos na nossa viagem ao Cáucaso, na qual explorámos a Arménia, Geórgia e Azerbaijão. Muitas diferenças, nomeadamente religiosas, mas também muitas similitudes. Um pé a Ocidente e outro a Oriente.
Nesta região que vai do Mar Negro ao Mar Cáspio e que é frequentemente considerada o limite sudeste da Europa com a Ásia, a cultura gastronómica presente nos três países que visitámos assimilou muitas influências, tanto a Ocidente como a Oriente, e cruza-se em muitos pontos.
O pão, ainda que com diferenças, é um elemento central em qualquer mesa da Arménia, Geórgia e Azerbaijão. Na Arménia o lavash é omnipresente. Este pão, feito de finas camadas, parece um lençol que se vai dobrando como quem o quer arrumar numa gaveta…mas é bom demais para ficar engavetado. A arrumar, e bem, é na barriga.


No mercado GUM, em Yeravan, é um deslumbre ver as mulheres a fazerem esta preciosidade. Parece um bailado. Estica de um lado, hidrata do outro, dobra noutro canto.



Mas não só de lavash se faz a cultura do pão na Arménia. No GUM encontram-se outras variedades de pão. 


Na Geórgia o pão chama-se puri e tem várias variantes, tonis puri, shotis puri e khachapuri. Sobre este último falarei noutro post.



E encontra-se em qualquer esquina, como nesta padaria em Tbilisi.



O pão é de tal forma sagrado e abençoado que, no Azerbaijão, quando já impróprio para consumo, não é colocado no chão com o resto do lixo, mas antes colocado pendurado numa árvore ou gancho. Por outro lado, neste país, comer pão com alguém é selar um vínculo de amizade.



A melancia é uma fruta sempre presente nos três países. À mesa, nos mercados, nas ruas, em qualquer situação.
Como em, Goshavank, no norte na Arménia, onde um velho Lada é a melhor vitrina.


Nas frondosas bancas do mercado GUM, na capital Arménia.


Em Mestia, a porta para a belíssima região montanhosa de Svaneti, na Geórgia.


Mas também numa rua de Sheki, no Azerbaijão, acompanhado do também muito presente melão.


Até na arte a melancia e o melão estão representados.
Veja-se a representação destes frutos no estonteante interior do Palácio de Inverno em Sheki, no Azerbaijão.

Interior do Palácio de Inverno, Sheki

Esta representação artística também integra o pepino, que, a par do tomate, está em qualquer salada que venha para a mesa, bem como em qualquer banca na rua ou mercado.

Almoço em Ushguli

Venda de rua em Sheki

Estes dois frutos são também comuns ao pequeno-almoço, como no generoso que nos foi servido na guesthouse onde ficámos em Mestia, Geórgia.


A romã é o fruto nacional da Geórgia e Arménia, pelo que também está representada na arte e em vários pratos, saladas e nos sumos. 

Pormenor do mural Renascimento da Arménia, de Grigor Khanjyan

Porém, à época da nossa viagem ainda não era a época deste fruto, que se encontrava a amadurecer na árvore. Ainda assim, bebemos um sumo em Tbilisi e comemos algumas saladas com as sementes da romã.


A beringela é também um dos elementos gastronómico muito presentes, ao ponto de termos degustado quase todos os dias um prato com este ingrediente, que muitos chefs consideram desafiador trabalhar, pelo sabor neutro que apresenta.
Os georgianos conseguiram criar algo muito entusiasmante, o badrijani nigvzit. Trata-se de um prato composto de fatias de beringela com pasta de noz e alho, que veio a revelar-se um dos nossos favoritos.


A noz, bem como outros frutos secos, são também uma constante.
churchkhela é um símbolo na Arménia e Geórgia. Trata-se de um elemento alongado, como uma linguiça, com noz envolvida por um caramelo feito a partir do sumo da uva ou de romã.


Mercado GUM, Yerevan

Entrar nos mercados locais é entrar numa viagem pelo mundo dos frutos frescos, uma delícia ao paladar e ao olhar. O sabor daqueles alperces secos do mercado GUM, em Yerevan, não nos sai da cabeça.

Taza Bazaar, Baku

Taza Bazaar, Baku

As compotas são também uma constante. Nos mercados, à mesa, nos sumos. Sim, nos sumos. É um clássico por estas coordenadas fazer-se sumos com parte da compota. Para quem gostar de bebidas doces é o máximo. Não virei fã.

Taza Bazaar, Baku

Taza Bazaar, Baku

Quando deambulamos pelas estradas do Cáucaso, no meio de paisagens maravilhosas, por vezes a única presença humana evidente são as caixas de produção de mel. Em algumas situações marcam mesmo a paisagem.
O produto final, engarrafado, encontramos inúmeras vezes à venda à beira e nos mercados.

Frascos de mel no Taza Bazaar, Baku

Por fim, os kebabs e os barbecues de carne de cordeiro, vaca, porco e galinha são uma adoração em todo o Cáucaso.
Num momento de encontro entre amigos este momento nunca faltará. Connosco também não faltou.

Kebab em Yerevan

Barbecue em Mestia

Feita uma viagem pelas semelhanças gastronómicas dos três países, de seguida faremos uma viagem individual às especificidades de cada um. A ordem da viagem por aqui será a mesma da que fizemos. Entraremos pela Arménia, deslocaremo-nos para Norte, para a Geórgia, para, por fim, irmos para nascente, para o Azerbaijão, onde terminaremos a nossa viagem nas margens do Mar Cáspio.
Neste caso a ordem não é "Apertem os cintos!", mas antes "Alarguem os cintos!".