O dia aproxima-se do fim. O estômago pede reforço.
O
cansaço de um dia a explorar a enorme cidade do México apodera-se.
Caminhamos pelas calles com destino a uma referência gastronómica
anotada. A Taqueria Los Cocuyos.
Já mesmo junto ao destino final, sentimos o aroma no ar, notamos a fila que se perfila junto
a uma pequena janela que se abre para a rua. Para sentar apenas uns pequenos
bancos, naquele momento todos ocupados.
Toda a dinâmica que vislumbramos encanta-nos, mas atendendo ao cansaço instalado, não nos podermos sentar vence-nos. Desistimos de ali ficar...Naquele dia... Porque voltamos logo no dia
seguinte, com outra disponibilidade física e ainda mais apetite.
No dia anterior ficámo-nos por três dos cinco sentidos, a visão, o olfacto e a audição. Os outros dois, o paladar e tacto, estão prestes a ser testados.
Encontramos um cenário igual ao da véspera. Sai um ligeiro fumo, com um aroma
delicioso, da grande panela cheia de diversas carnes. Há também fila, a qual
ajudamos a adensar. Enquanto esperamos assistimos a todos os movimentos. No
pequeno espaço, dois homens manejam na perfeição todo o processo. Um terceiro, do lado de
fora, regista os pedidos, informa os outros dois sobre os mesmos e recebe o
dinheiro.
A partir da ordem exterior, no diminuto interior, inicia-se
a elaboração dos tacos. Suadero e Campechano são dos mais pedidos. Percebemos.
Para o Campechano um dos homens retira da imensa panela um naco de carne e uma longaniza (linguiça). Com um cutelo parte, veementemente, ambos os
ingredientes em pequenos pedaços.
Vão revezando de tarefas. Tanto estão no corte dos
ingredientes, como a mexer os ingredientes na panela e a reforçar a mesma com
mais conduto ou na chapa onde fritam as tortillas de milho dos tacos e dão a fritura final na carne.
O entrosamento é perfeito.
O taco de língua é outro que tem saída. A língua já está
cozida e encontra-se num recipiente ao lado da panela, com outros ingredientes.
É aí que devem estar os olhos também. Sim, taco de ojo é outra possibilidade,
tal como tripa, molleja e cabeza.
A nossa escolha vai para o Campechano, Suadero e Lengua.
Enquanto esperamos deliciamo-nos com os que vão saindo.
Chega a nossa vez. Vemos toda a elaboração. Com um grande cutelo é feito o corte fino da
carne e da longaniza. As tortillas vão à chapa e são, através de movimentos curtos e rápidos, passadas pela gordura libertada pelas carnes. Assistimos também à retirada do plástico que
protege a língua e outras carnes, para logo de seguida ser cortada uma fatia
da grossura de um dedo.
São-nos entregues os pratos com os tacos. Sentamos-nos nos
pequenos bancos vermelhos que ocupam o passeio, enquanto a vida corre por aquela e muitas outras ruas da imensa Cidade do México.
Observamos a fisionomia daquele ex-libris gastronómico mexicano, beneficiado com a presença dos coentros e cebola picada, e com um apetite ansioso damos a
primeira trinca. Eu no taco de língua. A primeira impressão é excelente. Ao lado
oiço as outras reacções. "Uau! Maravilhoso!".
Começaram pelo Campechano. Deixo esse para o fim. E vou num
crescendo. Até chegar ao céu, que é como quem diz a saborear o taco Campechano.
Todos são excelentes, mas este entra nas nossas
memórias gastronómicas, que saíram mais ricas depois de conhecermos a Taqueria
Los Cocuyos.
Quase duas semanas passaram e voltamos à Cidade do México, depois de uma deambulação por outras coordenadas mexicanas.
Os tacos dos Los Cocuyos continuam presentes nas nossas mentes e corações e só de pensar fazem-nos salivar.
Sem qualquer hesitação decidimos regressar. Dizem que não se deve voltar onde se foi feliz, mas contrariámos essa ideia. E não nos arrependemos.
Todas as memórias positivas repetiram-se e saíram reforçadas, com o acréscimo de termos tido a oportunidade de experimentar outras variantes.
Lembram-se do taco de cabeza e de ojo? Desta vez escolhi-os sem medos e saboreei-os minuciosamente e totalmente deliciada. São óptimos.
Como todos. No entanto, o Campechano continuou a ser unanimemente o nosso favorito. O melhor taco de todo o México. Assim o elegemos.
Pelas ruas, envoltas pela noite, e aquela hora silenciosas, regressamos ao hotel com o estômago radiante e a cabeça a rebobinar toda a mestria dos movimentos aplicados na elaboração daquela quinta-essência. É com essa imagem que adormecemos. Não sonhámos, porque tudo, felizmente, foi real.